Enfim. Se estás cansado disto não és o único. Já corre o mundo o movimento slow science. Um dos manifestos você pode ler abaixo. E se concordar, assine o manifesto você também. O link para assinatura é: http://slowscience.fr/?page_id=8
O link para a página em português do movimento é: http://slowscience.fr/?page_id=68
Pesquisadores,
professores, nós precisamos urgentemente desacelerar! Vamos nos
libertar da síndrome da Rainha Vermelha! Pare de querer seguir cada
vez mais rápido. Pare de querer seguir cada vez mais e mais rápido,
o que resulta apenas em estagnação ou até mesmo retrocesso. Na
mesma toada do Slow Food, Slow City e Slow Travel, nós criamos o
movimento Slow Science.
Olhar,
pensar, ler, escrever, ensinar. Tudo isso leva tempo e nós temos
cada vez menos tempo para isso, se é que já não perdemos
completamente esse tempo. Dentro e ao redor de nossas instituições,
a pressão social promove a cultura do imediatismo e do urgente. Com
produções em tempo real, os projetos vão e vêm em um compasso
cada vez mais rápido. E nossas vidas profissionais não são as
únicas vítimas dessa pressão: um colega que não está
sobrecarregado e estressado é visto como excêntrico, apático ou
preguiçoso – tudo em detrimento da ciência. A Fast Science, assim
como a Fast Food, prima pela quantidade acima da qualidade.
Nós
multiplicamos nosso projetos de pesquisa para angariar fundos para
nossos laboratórios, que muitas vezes estão em condições
deploráveis. Resultado: assim que acabamos de desenvolver um
programa e, por mérito ou sorte, conseguimos financiamento,
precisamos imediatamente pensar na próxima proposta, em vez de nos
dedicarmos ao primeiro projeto.
Como
os avaliadores e outros especialistas também estão sempre com
pressa, nossos currículos são corriqueiramente avaliados somente
pela sua extensão: quantas publicações, quantas apresentações,
quantos projetos? Esse fenômeno cria uma obsessão pela quantidade
na produção científica. Resultado: é impossível ler tudo, mesmo
dentro de uma especialidade. Assim, muitos artigos nunca são citados
e talvez nunca sejam lidos. Nesse contexto, é cada vez mais difícil
localizar as publicações e apresentações que realmente importam –
aquelas em que um colega despendeu meses, às vezes até anos,
aperfeiçoando – entre outras milhares que são duplicadas,
recortadas, recicladas, ou até mais ou menos “emprestadas”.
Claro
que nossa formação deve ser “inovadora”, obviamente de “alta
performance”, “estruturada” e adaptada ao “desenvolvimento de
novas competências”. É difícil identificar as mudanças
apropriadas em um mundo em movimento constante. Como resultado dessa
corrida frenética rumo à “adaptação”, a questão do
conhecimento fundamental a ser passado adiante – conhecimento que,
por definição, não se altera – não está mais na agenda dos
cientistas. O que importa é estar em sintonia com os tempos e,
especialmente, mudar constantemente para manter a máquina em
funcionamento.
Se
aceitamos responsabilidades administrativas (conselhos
universitários, departamentais ou administração de laboratórios),
como todos somos obrigados a fazer durante nossa carreira acadêmica,
somos automaticamente obrigados a preencher um número sem fim de
formulários, muitas vezes dando a mesma informação e as mesmas
estatísticas pela enésima vez. Ainda mais sério, o resultado da
burocracia generalizada e da “encontrite” – a última, com o
intuito de manter a aparência de colegialidade enquanto, em geral,
acaba por esvaziar sua essência – é que ninguém tem tempo para
nada: é preciso avaliar a submissão que foi recebida hoje para que
seja implementada amanhã! E enquanto fazemos dessa situação uma
caricatura, essa realidade se aproxima.
Essa
degeneração da nossa atividade não é inevitável. Resistir à
Fast Science é possível. Nós temos a chance de construir a Slow
Science, dando prioridade a valores e princípios:
nas
universidades, a pesquisa é o motor da educação, apesar dos
ataques repetidos daqueles que sonham em eliminar a pesquisa das
universidades francesas. É imperativo preservar ao menos 50% de
nosso tempo à atividade de pesquisa, que determina a qualidade de
tudo o mais. Em termos concretos, isso implica a rejeição de
qualquer atividade que venha a confrontar-se com esses 50%.
pesquisar
e publicar enfatizando a qualidade exige que todos nos concentremos
nessas atividades por um período suficientemente longo. Para esse
fim, nós necessitamos de períodos regulares sem responsabilidades
administrativas ou de ensino (o direito de se dedicar
exclusivamente à pesquisa um semestre a cada 4 anos, por exemplo).
não
devemos focar na quantidade no currículo. Universidades estrangeiras
já apontam para este caminho ao limitar a cinco o número de
publicações que podem ser mencionadas em submissões para doutorado
ou uma vaga na universidade (“Reward quality not quantity”,
Trimble, S.W., Nature, 467 : 789, 2010). Esse princípio pressupõe
que devemos decidir, em colegiado e de forma transparente, como
avaliar nossos cientistas pela qualidade de sua produção
científica, não pela quantidade de publicações e comunicações.
nutrida
pela pesquisa, a missão por excelência dos cientistas de uma
universidade é passar o conhecimento adquirido adiante. Os membros
dos institutos devem ter tempo para ensinar, através do
aprimoramento de suas condições de trabalho. Quanto tempo é gasto
em solucionar problemas práticos, muitas vezes triviais, e que estão
além das atribuições de seu trabalho? O tempo gasto em tarefas
administrativas e na “criação de modelos” deve ser reduzido. Os
tão famosos “modelos” deveriam realizar apenas a tarefa de
definir o currículo específico para uma disciplina em uma
universidade. Não é necessário mudar esse quadro a cada quatro ou
cinco anos, como é o caso atualmente.
em
nossas tarefas administrativas, é preciso reivindicar tempo para
estudar as questões que estão diante de nós. Para o interesse de
todos, devemos analisar o conteúdo criticamente. Rejeite então a
pequena democracia e colegialidade criadas ao votar em tópicos que,
no melhor caso, só serão analisados superficialmente. Não há
nenhuma razão para aceitar a ideologia da urgência, repetida ad
nauseam pelo ministro e seus “administradores”.
De
forma mais geral, nós não devemos esquecer que há vida fora da
universidade. Nós precisamos de tempo para nossas famílias, nossos
amigos, nosso lazer… para o prazer de não fazer absolutamente
nada!
Se
você concorda com esses princípios, assine a petição pela
fundação do movimento Slow Science. Acima de tudo, permita-se um
tempo antes de decidir assinar a petição ou não!
Joël
Candau, October 29, 2010 (published July 17, 2011)
Tradução
do inglês e do francês para o português: Janaisa Martins Viscardi
(UNICAMP, Brasil)