domingo, 12 de outubro de 2014

Geógr@fos com Dilma


Exercer a crítica também é saber escolher lado. Escolher lado não significa se eximir da crítica (inclusive de quem apoiamos). Neste segundo turno, meu lado é Dilma.

Visitaste o blog por causa da Geografia? Que tal escolher lado e assinar o manifesto Geógr@fos com Dilma? 

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quinta-feira, 5 de junho de 2014

David Harvey sobre o livro de Piketty


O texto abaixo encontrei publicado no seguinte blog: redecastorphoto

Para acessar o original, siga o link do sítio do próprio David Harvey aí do lado ou siga este link direto para o texto em inglês

[*] David Harvey − Reading Marx's Capital with David Harvey
“Afterthoughts on Piketty’s Capital”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Thomas Piketty escreveu um livro intitulado Capital que causou furor. Advoga a taxação progressiva e um imposto sobre a riqueza global como único modo para conter a tendência na direção de criar-se uma forma “patrimonial” de capitalismo, marcado por – como diz ele – desigualdades “aterrorizantes” de riqueza e renda. Também documenta, em detalhes dolorosíssimos e difíceis de retrucar, o modo como a desigualdade social de riqueza e de renda evoluiu ao longo dos dois últimos séculos, com especial atenção ao papel da riqueza.
Tomas Piketty também demole a visão amplamente disseminada segundo a qual o capitalismo de livre mercado distribuiria riqueza e que seria o grande instrumento para defender as liberdades e direitos individuais. O capitalismo de livre-mercado, na ausência de qualquer intervenção de redistribuição pelo Estado, como Piketty mostra, só produz oligarquias antidemocráticas. Essa demonstração gerou crises de apoplexia entre os liberais, como se viu no apoplético Wall Street Journal.

O livro tem sido apresentado como substituto do século XXI, para obra de mesmo título de Karl Marx, no século XIX. Piketty, de fato, nega que tenha tido tal intenção, o que me parece bem razoável, posto que o seu livro absolutamente não trata de capital. Absolutamente não nos diz por que aconteceu o crash de 2008 nem por que está demorando tanto para tanta gente livrar-se da dupla carga do desemprego prolongado e das milhões de casas perdidas para bancos credores. Tampouco ajuda a compreender por que o crescimento anda tão miserável nos EUA, ao contrário do que se vê na China, nem por que a Europa está aprisionada numa política de austeridade tanto quanto numa economia de estagnação.

O que Piketty, isso sim, mostra estatisticamente (e muito temos a agradecer a ele e sua equipe pelas estatísticas) é que o capital sempre tendeu, ao longo de toda sua história, a produzir níveis cada vez maiores de desigualdade. Não que seja novidade para muitos de nós. Além do mais, é essa, precisamente, a conclusão teórica a que chega Marx no Volume Um de sua versão de O Capital. Piketty sequer percebe a coincidência, o que não chega a surpreender, porque ele já disse inúmeras vezes, em resposta a acusações da imprensa-empresa de direita, de que ele seria um marxista disfarçado, que jamais leu O Capital, de Marx.

Piketty reúne muitos dados em apoio a seus argumentos. O que diz das diferenças entre renda e riqueza é útil e persuasório. E defende atentamente os impostos sobre a herança, a taxação progressiva e um imposto sobre a riqueza global na medida do possível (embora, quase com certeza, não seja politicamente viável), como antídotos contra concentração ainda maior de riqueza e poder.

Mas por que ocorre essa tendência na direção de desigualdade sempre crescente ao longo do tempo? Considerados seus dados (temperados com algumas alusões literárias a Jane Austen e Balzac), ele deriva uma lei matemática para explicar o que acontece: a acumulação sempre crescente de riqueza pelos tais famosos 1% (termo popularizado graças ao curso do movimento “Occupy”) deve-se ao simples fato de que a taxa de retorno sobre o capital (r) é sempre maior que a taxa de crescimento da renda (g). Isso, diz Piketty, é e sempre foi “a contradição central” do capital.

Mas uma regularidade estatística dessa ordem dificilmente seria explicação adequada, muito menos viraria lei. Assim sendo, que forças produzem e sustentam tal contradição? Piketty não diz. A lei é a lei e... não se fala mais nisso. Marx obviamente teria atribuído a existência de tal lei ao desequilíbrio de poder entre capital e trabalho. E é explicação que ainda se mantém em pé. O firme declínio da fatia do trabalho na renda nacional desde os anos 1970s derivou do declínio do poder político e econômico do trabalho, com o capital mobilizando políticas de tecnologias, de desemprego, de deslocalização e políticas anti-trabalho (como as de Margaret Thatcher e Ronald Reagan) para esmagar toda a oposição.
Como Alan Budd, conselheiro econômico de Margaret Thatcher confessou em momento de descuido, as políticas anti-inflação dos anos 1980s mostraram-se
(...) excelente modo de aumentar o desemprego; e aumentar o desemprego revelou-se modo altamente desejável para reduzir a força das classes trabalhadoras (...) O que foi ali construído em termos marxistas foi uma crise do capitalismo que recriou um exército de reserva de mão de obra, e permitiu que os capitalistas obtivessem altos lucros desde então.
A disparidade na remuneração entre trabalhadores médios e os altos executivos−gerentes permaneceu em torno de 30:1 em 1970. Hoje já está bem acima de 300:1, e no caso da empresa MacDonalds é superior a 1.200:1.

Mas no Volume 2 de O Capital de Marx (que já se sabe que Piketty também não leu, dado que descarta o que ali leria), Marx destacou que a tendência do capital para mandar abaixo os salários chegaria, num certo ponto, a restringir a capacidade de o mercado absorver o que o capital produzisse. Henry Ford identificou esse dilema há muito tempo, quando mandou pagar US$ 5 por dia de oito horas de trabalho aos seus operários, para, disse ele, estimular uma demanda de consumo. Muitos disseram que a falta de demanda efetiva levou à Grande Depressão dos anos 1930s. Foi o que inspirou as políticas expansionistas Keynesianas de depois da IIª Guerra Mundial e resultou em algumas reduções em desigualdades de rendas (embora nem tanto nas da riqueza) em pleno forte crescimento gerado por demanda. Mas essa solução repousava sobre o relativo empoderamento do trabalho e a construção do “estado social” (termo de Piketty) que os impostos progressivos criaram.
Tudo considerado – Piketty escreve – ao longo do período 1932-1980, quase meio século, a mais alta taxa de imposto federal nos EUA foi em média 81%.
E isso de modo algum reduziu o crescimento (mais um dado dos que Piketty reuniu, que desmente crenças da direita).

Ao final dos anos 1960s, já era claro para muitos capitalistas que tinham de fazer alguma coisa contra o excessivo poder do trabalho. Daí a destituição de Keynes, arrancado do panteão dos economistas respeitáveis; a mudança para o pensamento de Milton Friedman que pensa pelo lado da oferta; a cruzada para estabilizar, quando não para reduzir impostos, para desconstruir o estado social e para disciplinar as forças do trabalho. Depois de 1980, os impostos caíram e os ganhos de capital – fonte importante de renda para os ultra ricos – foram taxados em patamar muito inferior nos EUA, o que aumentou muito o fluxo da riqueza na direção do 1% de cima. Mas o impacto sobre o crescimento, como Piketty mostra, foi desprezível. O tal “efeito contaminação” dos benefícios dos ricos para o resto (outra das crenças preferidas da direita) não funciona. Nada disso foi ditado por qualquer lei matemática: tudo aí foi sempre questão política.

Mas então o timão fez volta completa e a pergunta passou a ser: que fim levou a demanda? Piketty ignora sistematicamente essa pergunta.

Os anos 1990s fugiram de ter de responder, com vasta expansão do crédito, incluindo a extensão do financiamento de hipotecas na direção dos mercados de papeis podres. Mas a bolha resultante estava condenada a explodir, como explodiu, em 2007-8, levando abaixo os Lehman Brothers e todo o sistema de crédito. Mas os lucros e a maior concentração de riqueza privada recuperaram-se muito rapidamente depois de 2009, enquanto tudo e todos continuaram a ir mal e cada vez mais mal. As taxas de lucro dos negócios são hoje tão altas como sempre foram nos EUA. Os negócios estão sentados sobre montes de dinheiro e recusam-se a gastá-lo porque o mercado não mostra condições robustas.

A formulação, por Piketty, da lei matemática disfarça, mais do que revela, a política de classes envolvida. Como Warren Buffett observou,
(...) claro que há guerra de classe, e é a minha classe, os ricos, que fazem a guerra; e estamos ganhando.
Uma medida chave da vitória deles é a crescente disparidade de riqueza e renda do 1% do topo, em relação a todos as demais pessoas.

Mas há, contudo, uma dificuldade central com o argumento de Piketty. Ele repousa – no sentido de “ele depende” – numa definição errada de capital. Capital é um processo, não uma coisa. É um processo de circulação no qual o dinheiro é usado para fazer mais dinheiro quase sempre, mas não exclusivamente, mediante a exploração da força de trabalho.
Piketty define capital como o estoque de todos os bens de propriedade de indivíduos privados, corporações e governos e que podem ser comercializados no mercado não importa se aqueles ativos estão sendo usados ou não. Aí se inclui terra, imóveis e direitos de propriedade intelectual tanto quanto minha coleção de joias e peças de arte. Como determinar o valor de todas essas coisas é um difícil problema técnico para o qual não há solução unanimemente aceita.

Para calcular uma taxa significativa de retorno, “r”, temos de ter algum modo de atribuir valor ao capital inicial. Infelizmente, não há modo de atribuir-lhe valor independentemente do valor dos bens e serviços que ele é usado para produzir ou por quanto pode ser vendido no mercado. Todo o pensamento econômico neoclássico (que é a base do pensamento de Piketty) é fundado sobre uma tautologia.

A taxa de retorno sobre o capital depende crucialmente da taxa de crescimento, porque para atribuir valor ao capital considera-se o que ele produz, não o que foi usado para produzi-lo. Seu valor é pesadamente influenciado por condições especulativas e pode ser seriamente distorcido pela famosa “exuberância irracional” que Greenspan diagnosticou como típica dos mercados de ações e de moradias. Se se subtrai moradia e propriedades imóveis – para nem falar do valor de coleções de arte dos donos de hedge funds – da definição de capital (e o argumento para incluí-las é bem fraco), nesse caso a explicação de Piketty para as crescentes disparidades em riqueza e renda cairiam de cara no chão, embora as descrições que oferece do estado das desigualdades presentes e passadas ainda se mantivessem em pé.

Dinheiro, terra, imóveis e fábricas e equipamento que não estejam sendo usados produtivamente não são capital. Se a taxa de retorno sobre o capital que está sendo usado é alta, então assim é porque uma parte do capital é tirada de circulação e, pode-se dizer, entra em greve. Restringir a oferta de capital a novos investimentos (fenômeno que testemunhamos agora) garante alta taxa de retorno sobre aquele capital que está em circulação.

A criação de tal carência artificial não é só o que as empresas de petróleo fazem para garantir suas altas taxas de retorno: é o que todo e qualquer capital faz se tiver chance. Isso é o que está na base da tendência de a taxa de retorno sobre o capital (não importa como seja definido e medido) sempre exceder a taxa de crescimento da renda. É assim que o capital garante a própria reprodução, não importa o quão desconfortáveis sejam as consequências, para o resto de nós. E é disso que a classe capitalista vive.

Há muito de trabalho valiosíssimo nas tabelas de dados que Piketty reuniu. Mas sua explicação de por que as desigualdades e as tendências oligárquicas surgem, essa, é gravemente viciada. Suas propostas, seus remédios para as desigualdades, são ingênuos, se não utópicos. E com certeza absoluta Piketty não produziu modelo operativo para o capital no século XXI. Para essa finalidade, ainda precisamos de Marx e permanecemos à espera de equivalente contemporâneo

quarta-feira, 14 de maio de 2014

O pânico dos conservadores por causa de um livro


Ainda nem apareceu em português, mas o novo livro do francês Thomas Piketty já está dando o que falar também no Brasil. E isto que por falta de acesso aos dados sobre a riqueza do topo da pirâmide brasileira, nosso país não foi incluído nas análises do livro.
A tese é velha mas profundamente documentada e provada: o neoliberalismo está concentrando riqueza e, mais importante, que o aumento da riqueza do topo não vem de atividades produtivas, mas sim puramente de herança e rendimentos financeiros.

Para ler um comentário do Prêmio Nobel Paul Krugman, siga por aqui (texto que deu origem a este post). Aliás, por que quase não se vê na Geografia discussão de suas propostas e pesquisas sobre a "Nova geografia econômica"? Mistérios.

De qualquer maneira, vejam o trecho inicial da análise do link acima:
"O novo livro do economista francês Thomas Piketty, “O capital no século XXI”, é um prodígio de honestidade. Outros livros de economia foram um sucesso nas vendas, mas diferentemente da maioria deles, a contribuição de Piketty tem uma séria erudição, capaz de mudar a retórica. E os conservadores estão aterrorizados.Por isso, James Pethokoukis, do American Interprise Institute, adverte na revista “National Review” que o trabalho de Piketty precisa ser refutado porque, do contrário, “se propagará entre a clerezia e dará nova forma ao cenário da economia política em que serão travadas todas as futuras batalhas sobre política”.Pois bem, lhes desejo boa sorte nesta empreitada. Por enquanto, o que de fato surpreende no debate é a direita parecer incapaz de organizar qualquer tipo de contra-ataque significativo à tese de Piketty."
Para um comentário sobre as dificuldades de Piketty em conseguir os dados brasileiros, veja a seguinte reportagem:
Diário do Centro do Mundo

A equipe de economistas e pesquisadores de Piketty tem um site com dados levantados durante a feitura do livro e que promete, para breve, informações para mais 50 países - incluindo o Brasil. Para quem quiser dados de deixar os conservadores num debate quase sem ter o que falar, a não ser espumar, aqui está:
The World Top Incomes Database

quarta-feira, 30 de abril de 2014

O ESPAÇO NO LUGAR?


Dando seqüência à serie, mais um texto de Armando Corrêa da Silva:

O ESPAÇO NO LUGAR?


A crise da Geografia tem uma vantagem em relação à crise dos demais campos do conhecimento. A reflexão filosófica dela esteve ausente durante muito tempo: mais precisamente, alguns clássicos ainda a praticaram, mas a deficiência do preparo filosófico constitui sempre uma barreira ao encaminhamento da solução.
O “terra-a-terra” dos geógrafos deve explicar-se como determinação de seu objeto e, ao mesmo tempo, como a preocupação mais com o território do que com a região, a área, o lugar e o espaço. Mais com o lugar, tomado isoladamente (ideograficamente) do que com as relações espaciais. A preocupação recente com estas não partiu da reflexão, mas foi determinação externa de um mundo cada vez mais unido pelas comunicações, que põe em crise a atomização local, regional e nacional.
Cabe, então, mesmo que tardiamente, retomar a reflexão. Mas esta não se põe, se o problema filosófico não está resolvido.
Por isso, mesmo que de forma autodidata, arrisco a fazer aqui algumas observações sobre o movimento da razão científica, tal como o entendo, na realização da produção intelectual.
O procedimento didático impõe-se, então, como instrumento de clarificação da proposição.

Da práxis à epistemologia

A práxis implica uma demonstração teórica e em uma demonstração prática.
A primeira remete à consistência do argumento e a segunda à verificação empírica. O trabalho intelectual científico tem essa característica.
É essa práxis que constitui a gênese da produção da teoria, que se realiza como proposição e argumento ontológicos.
A ontologia, uma vez delineada, remete à epistemologia.
A epistemologia, enquanto discurso crítico, baseia-se na gnosiologia, na teoria do conhecimento, na lógica e na metodologia.
Vejamos cada ma delas, pois disso depende a elaboração do saber, que constitui o input de uma nova realização da práxis.
O que se segue são suposições, que podem ser compreendidas como hipóteses sistêmicas.
Em gnosiologia o ponto de partida é o raciocínio. Produzindo o conceito-ideia, ele leva à compreensão. O conceito-ideia expressa-se como categoria, que remete à memória cultural, voltando em feed-back ao raciocínio.
O raciocínio produz a consciência, que é conceito-ideia e compreensão. Mas a consciência não pode realizar-se sem a intuição. É nessa relação que se põe a pré-ideação. Por isso, também a impressão-expressão. Esta causa a emoção (que é manifestação da social-natural da humanidade). A memória cultural registra a pré-ideação.
A intuição remete à sensibilidade que é a forma de pôr-se a sensação (o sensível), e o sistema nervoso, que programa a memória genética. Esta põe-se como feed-back do sistema nervoso. Por isso, a memória genética registra também a pré-ideação.
A memória genética e a memória cultural entram em interação como determinações naturais e sociais.
Então, a gnosiologia estuda a estrutura e funcionamento do conhecimento.
A teoria do conhecimento propõe-se, inicialmente, como conteúdo e forma. O conteúdo, como significado, apresenta-se como real e aparente. A forma, como significante, apresenta-se, igualmente, como real e aparente.
Há, então, uma estrutura e funcionamento do conhecer, que se põe, desde logo, como linguagem. Há a linguagem do senso comum e a linguagem do conhecimento científico. A linguagem é relação sujeito-objeto como prática ou como teoria. No primeiro caso, ela remete à verificação empírica e ao comportamento. Por isso, é a transformação inadequada do real; a verdade, a transformação adequada do real. No segundo caso, ela remete às representações lógicas e às ideias. Por isso, o erro é o conhecimento das aparências das determinações; a verdade, o conhecimento das essências das determinações.
Essa estrutura e funcionamento do conhecer produz, como resultado, a verdade lógica, como conhecimento da essência das determinações, o que leva à solução do problema: produz, também, a verdade empírica, como transformação adequada do real, que corresponde à satisfação da necessidade e, por isso, remete à solução do problema.
A verdade lógica é input da relação inicial de conteúdo-forma, do mesmo modo que a verdade empírica.
Este sistema fechado tem modalidades de coerência interna.
A lógica dá conta desta coerência interna, enquanto estrutura e funcionamento do pensamento.
Em primeiro lugar, como símbolo e sinal, significado e significante.
Em segundo lugar, como afirmação, negação e negação da negação.
Em terceiro lugar, como identidade, não contradição e terceiro excluído.
Em quarto lugar, como parte e todo.
Assim, como lógica simbólica, como lógica dialética, como lógica formal e como lógica estrutural.
O conjunto da estrutura e funcionamento do pensamento põe-se então, sistematicamente, como interação entre significado e movimento, significado e forma, significado e análise, que é output do significado.
Mas como realizar essas operações?
A metodologia procura ser a resposta.
Ela lida com a explicação e a descrição. A explicação é encadeamento de raciocínios, que produzem a interpretação. Ela é a mediação entre o concreto lógico e a abstração. A descrição, que se subdivide em hipótese, observação, análise e generalização, produz a investigação, que é mediação entre a abstração e o concreto sensível.
Se se caminha do concreto lógico ao concreto lógico, da abstração à abstração, do concreto sensível ao concreto sensível, tem-se a dedução. Então, a explicação é sempre um processo de dedução. Se a caminhada do concreto lógico à abstração e desta ao concreto sensível, ou do concreto sensível à abstração e desta ao concreto lógico, tem-se a indução. Dedução e indução relacionam-se porque não há explicação sem descrição e descrição sem explicação no conjunto do pensar.
A epistemologia produz-se, então, como discurso estrutural-funcional, que se expressa como comunicação. 
O problema realmente difícil põe-se como registro de uma nova programação, que implica sempre a decodificação da mensagem. Por isso, o feed-back é sempre ontológico ou, mesmo, metafísico. Mas decodificá-lo é retomar o processo de produção da ontologia.
Põe-se o aplicar da proposição, como trabalho intelectual científico referido ao objeto da geografia.

(SILVA, Armando Corrêa da. De quem é o pedaço? Espaço e cultura. São Paulo: HUCITEC, 1986, pág. 131-134)

terça-feira, 15 de abril de 2014

Maria da Conceição Tavares

É possível discordar de algumas de suas posições, mas é impossível ficar indiferente. Mesmo quando está pessimista, ler seus textos ou ouvi-la falando é uma injeção de ânimo, no sentido de que ela ainda, no alto de seus 84 anos, consegue sacudir a poeira da indigência de muito dos debates e polêmicas atuais.

O texto completo, você encontra aqui.

Algumas passagens:

"Neste sentido, o século XXI se parece com o século XIX. Este desarranjo da coisa mundial, global... No século XIX, a Inglaterra era o império. Agora, os Estados Unidos... Também há uma contradição muito grande: um bruto desenvolvimento tecnológico, uma globalização de mercado que supera o século XIX. Mas o individualismo burguês, bem ou mal, tinha uma face progressista. O individualismo pequeno-burguês não tem face nenhuma! É uma coisa chata! É uma crise que se manifesta pela ausência, pelo vácuo e não sai daí. É um nó só. Ninguém sabe como desata!"

"Na verdade, se o PIB é “pibinho” ou não, qual o problema? Vai ser 2%, 3% ou 4%? O problema é ter emprego. Para mim, os critérios clássicos são emprego, salário mínimo e ascensão social das bases.

"Haja vista os nefastos episódios desses máscaras negras – os black blocs, esses garotos de merda –, a energia que fica é a da violência. Não sei até que ponto o povo propriamente dito precisa de utopia. Mas a classe média precisa. Não tendo, ela transforma sua mágoa em ódio. De fato, quem promove a violência não são os deserdados da terra, para quem as coisas melhoraram; são da classe média baixa. A energia só está se manifestando através da violência. Não tem energia utópica, só através da violência. Não tem utopia, só distopias. É só o aqui, agora; quero derrubar isto, derrubar aquilo. Não tem objetivo programático! É uma coisa esquisitíssima, enlouquecida: é fascistoide e anarquista ao mesmo tempo."

sábado, 12 de abril de 2014

Diagnóstico do limite


Dando seqüência à publicação de textos de Armando Corrêa da Silva. 
Referência: SILVA, Armando Corrêa da. De quem é o pedaço? Espaço e cultura. São Paulo, HUCITEC, 1986, pág. 141-143.

DIAGNÓSTICO DO LIMITE

O território comum

A noção de “pedaço” foi elaborada recentemente, por meio do que se denomina “imaginação geográfica”: “This imagination enables the individual to recognize the role of space and place in his own biography, to relate to the spaces he sees around him, and to recognize how transactions between individuals and between organizations are affected by tne space that separetes them. It allows him to recognize the relationship which exists between him and his neighborhood, his territory, or to use the language of the street gangs, his 'turf'” (Harvey, 1976:24)
A relação entre o indivíduo e seu entorno ocorre como prática do nosso. Não se trata de propriedade, no sentido econômico, mas das determinações do lugar por seu valor imanente, valor esse que não se põe separadamente do uso que os grupos humanos fazem do lugar.
Por isso, é muito aguda na pessoa, assim definida, o sentido de “nós” e “eles”. A referência pessoal confunde-se com a ideia de espaço de vida, vida esta que se põe como conjunto de relações de significado.
Então, perder espaço relaciona-se à própria sobrevivência da pessoa ou do grupo. Daí que exista a preocupação com o controle do lugar e das pessoas.
Mas ganhar espaço significa a multiplicação de lugares e grupos. Por isso, o lugar, com seis atributos, é determinação da situação populacional, que o modifica, ao crescer.

O problema da posse do lugar é, então decisivo. Posse que, como se viu antes, não significa propriedade nos sentidos econômicos e jurídicos.
Esse lugar é, então, uma disposição de partes, no interior de cada qual repete-se a prática do “nosso”, põe-se o sentido de “nós” e do “eles”, o problema da perda ou do ganho de espaço e a definição da posse. A parte é espaço do todo, mas perfeitamente localizada. A localização é inseparável do uso permanente ou eventual. E, mesmo, possível.
Para que isso ocorra há um desempenho de papéis, definido no processo de vivência do grupo e dos indivíduos. Por isso, há regras de conduta que nascem desse desempenho de papéis, relacionado à hierarquia de poder. Numa situação desse tipo sabe-se que “fora do poder tudo é ilusão”.
Daí as alianças, que se organizam como pactos reais ou simbólicos. Elas são duradouras ou efêmeras, dependendo do que se põe em jogo.
O poder deve, então, ser mantido, uma vez que a atribuição de mando depende não só dessa atribuição, segundo as regras, mas, também, da capacidade pessoal de mantê-lo, para o que se precisa da aprovação, pelo menos, da maioria. Há casos, de transição, em que a minoria pode deter o poder e ter o controle do lugar.
Por isso, pode pôr-se a situação em que a participação nas ações exclui membros do grupo, seja por razões objetivas ou, o que é mais frequente, por motivos subjetivos.
Daí, a dinâmica do lugar ser uma questão permanente de preservação do pedaço, ou, de outro modo, do espaço de vida e do entorno.
Mas a luta pela preservação do espaço de vida e do entorno começa, com o tempo, a modificar as relações que definem o lugar.

A região provisória


Num certo momento põe-se, ao indivíduo, o problema de “o que é meu”. Não se trata, também aqui, das determinações econômicas e jurídicas.
Então põe-se a questão: por que aqui?
Algo acontece com o indivíduo e o grupo, quando se põe o problema da estabilidade do espaço de vida. Antes, o território é referência de fixação. Agora, aregião é lugar de moradia.
A percepção das pessoas modifica-se, de uma relação de conflito, para uma relação de solidariedade. Daí, a pergunta: onde estão os outros?
É que, na passagem do território comum à região provisória, há perdas e ganhos. Modificam-se o grupo e os indivíduos. Modifica-se o lugar. Por isso, põe-se a necessidade de reolhar o entorno. Ele não é o mesmo.
Da determinação anterior põe-se a questão do limite: até onde?
A indeterminação relativa da nova situação implica redefinir o aqui e o ali. O lá e o cá. O embaixo e encima. O atrás e o à frente.
Impõe-se a visão do conjunto que implica a visão espacial.
Do alto, vê-se o horizonte. Vêem-se as nuvens.
Há uma sensação de tranquilidade que põe o problema do “há que pertencer”.
No momento em que a região se define ela já se põe como não-região. À medida que o espaço se expande ele se torna cada vez mais abstrato.
O limite se põe como interferência não determinada pelo território. A região já é a área possível.
Foi ultrapassada a fronteira.
O espaço de vida redefine-se como situação de tensão controlada.

A área de conflito


A determinação mais remota é a sensação de perda de algo que não pode mais ser recuperado. Por isso as comunicações são difíceis. Surgem, então, as necessidades dos contatos imediatos, que produzem e reproduzem as sensações de perda. Então, há interrupções e alternativas.
Há tensões e desgastes.
Impõe-se, então, a retomada de rumo, que implica caminhar em direção à abstração. Por isso, ultrapassa o limite.
O limite é então o lugar e são as relações, na fronteira. Como ultrapassar os limites da fronteira?

Bibliografia

Harvey, D. Social Justice and the City. Edward Arnold (Publishers) Ltd., London, 1976.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Pequenas pérolas sobre a Copa


Entreouvido durante a votação, na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, do projeto de Lei isentando de impostos as Empresas responsáveis pela instalação das Estruturas temporárias para a Copa no entorno do Beira-Rio:

"Existe algo de muito estranho quando Comunistas defendem isenção de impostos para Empresas enquanto neoliberais são contra"

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Estamos no final de março e quase todos os estádios estão prontos. Dos 12 estádios (sim, estádios, que frescura é essa de chamar de Arena??), 9 pertencem aos Estados/municípios e apenas 3 são privados. No momento em que escrevo, 5 deles ainda estão inacabados. E não é que TODOS os três estádios privados estão atrasados? Mas não era a iniciativa privada que era mais eficiente que o Estado??

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Se não bastasse a frescura de chamar Estádio de Arena (que virou moda recente no Brasil), a Prefeitura de Porto Alegre está instalando sinalização de trânsito na Av. Edvaldo Pereira Paiva em Português e Inglês. Até aí tudo bem, mas como é que estão traduzindo a indicação do Beira-Rio? Assim: "Soccer Stadium". Soccer?? Quantos turistas dos Estados Unidos virão assistir a Copa em Porto Alegre? Ou mesmo no Brasil? Ora, na Europa (aliás como na quase totalidade do mundo) Futebol é "Football", não Soccer. Alguém pode me explicar porque isto?

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

De quem é o pedaço?


O livro de Armando Corrêa da Silva, De quem é o pedaço?, está há muito esgotado. É uma pena, pois Armando não só foi um dos pioneiros na renovação da Geografia brasileira (naquilo que ficou conhecido como "geografia crítica"), tradutor do fundamental livro de David Harvey A justiça social e a cidade (também há muito esgotado), como um intelectual e professor ímpar na USP e na geografia brasileira. Sua obra merece ser resgatada e novamente discutida. Minha modestíssima contribuição é dispor novamente algum de seus textos, já que os novos alunos da Geografia hoje em dia praticamente desconhecem Armando. 

Este blog anda meio devagar, mas é minha intenção digitar/dispor mais textos do livro ao longo do ano. Aguardem!

O texto abaixo é o último do livro de mesmo nome. Mantive sem tradução as citações em outras línguas - como se encontra no original - porque não pretendo interferir no estilo do autor. Boa leitura.



De quem é o pedaço?
Armando Corrêa da Silva

O espaço da consciência possível

No capitalismo de livre-concorrência o espaço do indivíduo parece ilimitado. A Revolução se impõe a imensa tarefa de levar o progresso a todos os cantos do mundo!
Maquiavel viveu o momento inicial da formação do Estado Moderno em busca de sua unidade. Nos Principados do norte da Itália, o pequeno lugar determinava o espaço político possível, que dava origem à máxima consciência possível. Esses estados autônomos se relacionavam entre si num processo constante de conflitos. Na atmosfera do espaço político o destino individual dependia pouco das determinações externas e crescia o papel do Príncipe. O poder punha-se como o destino e a sorte. Por isso, dizia o florentino: “Concluo, portanto, por dizer que, modificando-se a sorte, e mantendo os homens, obstinadamente, o seu modo de agir, são felizes enquanto esse modo de agir e as particularidades dos tempos concordarem. Não concordando, são infelizes. Estou convencido de que é melhor ser impetuoso do que circunspecto, porque a sorte é mulher e, para dominá-la, é preciso bater-lhe e contrariá-la. E é geralmente reconhecido que ela se deixa dominar mais por estes do que por aqueles que procedem friamente. A sorte, como mulher, é sempre amiga dos jovens porque são menos circunspectos, mais ferozes e com maior audácia a dominam” (Machiavelli, 1979:210).
Escrito em 1513 o texto é considerado até hoje como um manual de ciência política, ultrapassando mesmo seu contexto de época.
No capitalismo de concorrência monopolista o espaço dos grupos é a forma normal de manifestações da democracia.
Vivendo as consequências práticas dessa situação, Lênin discutiu o assunto num contexto em que se punha a realização, também de uma mensagem mundial, de uma revolução socialista, nos limites de um Estado. Trata-se, agora, do espaço político de um grande espaço, que determina a máxima consciência possível. Como não se trata mais do individual, mas do coletivo, é discutida a forma democrática de existência do espaço político. Por isso dizia o autor, em agosto e setembro de 1917: “desenvolver a democracia até o fim; procurar as formas desse desenvolvimento, submetê-las à prova da prática, etc., nisto consiste uma das tarefas essenciais pela luta da revolução social. Tomado à parte, o democratismo, qualquer que seja, não dará o socialismo; mas na vida real o democratismo não será ‘tomado à parte’, ele será ‘tomado em conjunto’; exercerá igualmente uma influência sobre a economia, estimulará sua transformação; sofrerá a influência do desenvolvimento ecnômico, etc. Tal é a dialética da história nova” (Lenin: 1961:96).
O texto ultrapassa também o contexto em que foi escrito, como ciência política contemporânea.
No espaco político do presente repõe-se os espaços das pessoas e dos grupos.
Por isso, o espaço colonial, enquanto resultado da via colonial, manifesta-se como democracia contida pelo poder e manipulada por ele (Chasin, 1978).
Então, no espaço complementar, enquanto contradição do espaço colonial, a democracia é a busca da democracia enquanto espaço aberto contínuo na unidade diferenciada (Silva, 1979).
A sorte, de Maquiavel, e as circunstâncias, de Lenin, desempenham também aqui, o seu papel.
Por isso o espaço democrático é fragmentado na crise do pensar contemporâneo.

Os subespaços na crise epistemológica

Em Gramsci, a sorte e as circunstâncias, estão relacionadas ao papel do intelectual. Como os intelectuais se relacionam por sua condição de intelectuais, o prblema que se coloca é o dos intelectuais e os outros.
Como, para Gramsci, todos os homens são intelectuais embora nem todos exerçam essa função, põe-se ao intelectual, continuamente, a procura dos outros. Gramsci vive essa crise (Gramsci, 1978:15).
Daí a contradição epistemológica.
Para Lacoste, discutindo o papel do intelectual em Geografia, chega a defini-lo como um educador, que produz a informação científica crítica. Com o diz:
“Criticar é por em crise. Travar polêmica é fazer a guerra.
Nós não reformaremos a Geografia, viramo-la contra os nossos adversários.
É duma guerrilha epistemológica que se trata: as escaramuças ideológicas, as emboscadas teóricas seriam inúteis se não conduzissem a uma geografia alternativa e de combate.
Esta geografia, ao informar a prática dos militantes e dos sindicalistas, e por ela informada, permitiria aos grupos dominados melhor situarem o inimigo, melhor conhecerem e escolherem o terreno” (Lacoste, 1979:134).
Para Milton Santos, o intelectual é alguém que deve preparar-se para definir os fundamentos de “um espaço verdadeiramente humano, um espaço que una os homens por e para seu trabalho, mas não para em seguida os separar em classes, entre explorados e exploradores; um espaço matéria inerte trabalhado pelo homem, mas não para se voltar contra ele; um espaço. Natureza social aberta à contemplação direta dos seres humanos, e não um artifício; um espaço instrumento de reprodução da vida, e não uma mercadoria trabalhada por uma outra mercadoria, o homem artificializado” (Santos, 1978:219).
A crise epistemológica mostra o intelectual ante a sorte e as circunstâncias, como agente de um espaço autônomo, na crise, que deseja democrático.
Por isso, o espaço democrático é fragmentado, mesmo no processo da elaboração contemporânea do pensar.

Os subespaços na construção ontológica

Para Hartmann, o intelectual, na sorte ou nas circustâncias, põe-se como a ideia em trabalho. Por isso, a discussão do ser democrático remete-se às categorias dimensionais de espaço e tempo. Há uma oposição entre simultaneidade comprovável e não comprovável. Como diz: “Ontologicamente vistas las cosas, hay muchas en el mundo real que no son comprobables. Las hay donde quiera que los nexos entre ellas remiten a lo que no podemos hacer asequible con nuestros métodos de fijación. Simultaneidad puede existir, con todo su sentido, entre sucesos de sistemas en movimiento diferente, aún cuando no puede fijarse” (Hartmann, 1960:277).
Em Harvey, o intelectual é o construtor de modelos que são um instrumento para a ação. Com isso, relaciona a questão democrática ao trabalho. Mas o trabalho é o lidar com as ideias. Por isso “The argument is ontological, seeking to resolve the question 'what is space'? […]” Mais adiante, a questão é reformulada: “how is that different human practices create and make use of distinctive conceptualization of space?” (Harvey, 1973: 13/4)
Para Zeleny, o intelectual é o agente que busca a solução dos problemas teóricos. O intelectual lida com a teoria e propõe os termos em que a resolve. Por isso, diz: “Al mismo tiempo el núcleo del metodo de Marx – la concepción práctico-materialista de la realidad y de la teoria – se hace actual tal como fue elaborada em su forma primitiva em la critica de la economía política burguesa y de la filosofia especulativa, particularmente la de hegel. Sólo enlazando com esos elementos y ese profundo núcleo metódico de la teoría marxiana parece posible seguir avanzando em la explicación de la problemática ontopraxeológica de la segunda mitad del siglo XX” (Zeleny, 1974: 328).
O espaço político, fragmentado, reproduz-se no saber filosófico, também fragmentado. O espaço democrático das pessoas e dos grupos é o pôr-se em sequência esses fragmentos, articulando-os no processo de os fazer como reprodução e de os pensar como montagem.
Mas, quais os territórios possíveis?

O lugar da crítica na crítica do lugar

Em Lukács, um dos territórios possíveis é o território do ser social em Hegel. Trata-se de separar o verdadeiro do falso para restabelecer a integridade do pensamento. Como diz: “Desse modo, um conhecimento verdadeiro dos complexos que favorecem ou impedem a superação pode tornar-se, em determinadas circunstâncias, um componente ontologicamente real do próprio processo de superação. É evidente que o conhecimento dos processos naturais pode também levar à superação de complexos; e a série dessas superações vai desde a ciência da estrutura atômica até a criação de seres vivos. Na medida em que o conhecimento permite uma intervenção ativa em sua dialética, o processo tem lugar no campo do ser social, enquanto intercâmbio orgânico entre a sociedade e natureza, embora seja pressuposto indispensável à captação correta da dialética da natureza” (Lukács, 1979: 112).
Em Marx o território possível é o da História. Trata-se de combater a ideologia que se põe sem correspondência com a existência humana. Como diz: “Esta concepção da história consiste, pois, em expor o processo real de produção, partindo da produção material da vida imediata; e em conceber a forma de intercâmbio conectada a este modo de produção e por ele engendrada (ou seja, a sociedade civil em suas diferentes fases) como o fundamento de toda a história, apresentando-a em sua ação enquanto Estado e explicando a partir dela o conjunto dos diversos produtos teóricos e formas de consciência – religião, filosofia, moral, etc – assim como em seguir seu processo de nascimento a partir desses produtos; o que permite então, naturalmente, expor a coisa em sua totalidade (e também, por isso mesmo, examinar a ação recíproca entre estes diferentes aspectos)” (Marx, 1977: 55).
Em Ratzel o território possível é o da Geografia. Trata-se demostrar a correspondência existente entre o soslo, a sociedade e o Estado. Como diz: “a sociedade é o intermediário pelo qual o Estado se une ao solo. Segue-se que as relações da sociedade com o solo afetam a natureza do Estado em qualquer fase de seu desenvolvimento que se considere” (Ratzel, 1978: 10).
Então, o território, enquanto ser, duração e extensão, deve pôr-se em movimento.

O outro lado do disco

A linha de fuga conduz ao centro, que é centro recorrente, começo do encontro do movimento do território.
A sorte e as circunstâncias se põem como rarefações de fragmentos em convívio no quebra-cabeças. O intelectual parte-se em multidões de intelectuais que são subtotalidades sem conexões possíveis, na montagem plural.
Os territórios possíveis levam ao fim e ao começo.
Põe-se o real como pedaços que se sabem pedaços.
O fazer e o pensar indagam: de quem é o pedaço?

Bibliografia

Chasin, J. O integralismo de Plínio Salgado (formas de regressividade no capitalismo hipertardio). Livr. Ed. Ciências Humanas, São Paulo, 1978.
Gramsci, A. Os intelectuais e a organização da cultura. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1978.
Hartmann, N. Ontología IV. Filosofia de la naturaleza. Teoría especial de las categorías. Categorías dimensionales. Categorías cosmológicas. Fondo de Cultura Económica, México, 1960.
Harvey, D. Social Justice and the City. Edward Arnold, London, 1978.
Lacoste, Y. A Geografia serve antes de mais nada para fazer a guerra. Ed. do MG, São Paulo, 1979.
Lênin, V. I. O Estado e a revolução. Ed. Vitória, Rio de Janeiro, 1961.
Lukács, G. Ontologia do ser social. A falsa e a verdadeira ontologia de Hegel. Livr. Ed. Ciências Humanas, São Paulo, 1979.
Machiavelli, N. O príncipe. Ed. Tecnoprint, Rio de Janeiro, 1979.
Marx, K. A ideologia alemã. Ed. Grijalbo, São Paulo, 1977.
Ratzel, F. O solo, a sociedade e o Estado. Orig. em xerox, São Paulo, 1978.
Santos, M. Por uma Geografia nova. Hucitec-EDUSP, São Paulo, 1978.
Silva, A. C. da Cinco paralelos e um meridiano. Contribuição ao discurso geográfico teórico. Orig. em xerox, inédito, São Paulo, 1979.
Zeleny, J. La estructura lógica de “El Capital” de Marx, ed. Grijalbo, Barcelona, 1974.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Não tem preço

Depois de uma hibernação, o blog volta com um prazer pessoal recuperado: finalmente consegui comprar uma cápsula/agulha decente. Boa música e bons vinis: não tem preço!

Caixa ainda fechada, "namorando" meu Gradiente RP II

Começando a abrir o pacote: sim, é uma caixa de metal protegendo a cápsula!

Cápsula em cima do gabarito de alinhamento

Cápsula em seu lugar de direito

Alinhando

Álbum triplo! Jazz at The Santa Mônica

Pablo Rules!!

Alguns álbuns que voltaram a tocar!

Não tem preço! Ouvindo novamente em vinil uma obra-prima